quinta-feira, 8 de maio de 2008

Dino Buzzatti

Há leituras que emergem para a descoberta condicionadas ao prazer de uma certa cortesia quase medieval. De um encontro, uma conversa sobre livros pode ser um dar e dar cartilhado por referências comuns e tão apropriadas ao aprendizado quanto a descoberta do corpo-mundo é cura para o lugar comum.
Assim é descobrir Dino Buzzatti. Para grande parte dos leitores - mesmo dentre aqueles que conhecem Kafka, Borges ou Calvino - ele é um gigante invisível, porém nunca difícil ou hermético mas riquíssimo em imaginação fantástica, lírico e de ironia existencial. um primeiro contato com este amigo de Federico Fellini pode ser o " O Deserto dos Tártaros", um sóbrio labirinto do humor negro, acusação desapaixonada do medo militarizado pelo estranho. O absurdo árido deste romance é pontuado pela transformação de sua paisagem, a fronteira morta ao norte povoada também por uma História morta, a desconfiada rigidez de um forte inútil e posto avançado no limite do nada, à espera. E a ambição quase cândida, otimista e estúpida de Giovanni Drogo, contraponto de Vladimir e Estragon, por criar de si mesmo a espectativa da invasão bárbara: nossa couraça ocidental enferrujada e brilhante.
Seus contos não flertam apenas com situações absurdas e fantásticas, constróem alegorias de pesadelo, elevam o poético ao patético demolindo filosoficamente a própria razão ( em seu " As noites Difíceis" a pérola do delírio é para mim o conto "o que acontecerá no dia 12 de outubro?").Dino Buzzatti é, como albert Camus, o escritor lúcido destes tempos desesperados, cuja obra faz vazar o trister século vinte vertiginosamente para frente...

Nenhum comentário: