quarta-feira, 22 de julho de 2009

EU, LIVREIRO.

5.
Morávamos do quarto de empregada, minha mãe e eu, mas o apartamento era um duplex na cobertura em um dos melhores bairros da cidade, Ele,o patrão da minha mãe, era um arquiteto e empresário do ramo do comércio de plásticos.Quando chegava do escritório ia direto para a sala ampla onde eu,já devidamente treinado, levava o seu whisky. Ele tinha uma aparelho de som estúpido de grande numa parede a poucos metros da lareira. Sem brincadeira, tinha uma lareira. às vezes ele caía numa melancolia monomaníaca, ficava quieto bebericando o negócio dele e ouvindo a mesma coisa...ele podia ficar uma semana inteira nesse ritual ouvindo o mesmo vinil, quase sempre uma sinfonia ou uma sonata. Foram as várias vezes que Rhapsody in Blue tocou naquele aparelho , a forma como aquela música entrava pela casa inteira e parecia estourar para fora e se derramar andares abaixo até explodir ao céu o que despertou meu interesse pela música clássica. Desde sempre esta música paria inteligência e uma certa ausência de gravidade onde eu a ouvia. Convenci o Jorge colocar música clássica no sebo um tempo. No fundo gostou da idéia, a contragosto porque não tinha paciência, mas como comerciante observava seus clientes sorrirem para ele e elogiarem o gosto da casa. Ele me olhava como que pego numa armadilha, aí tirava da rádio mas no dia seguinte colocava de novo, sempre no horário do almoço.
As pessoas levavam os livros até o sebo para trocar ou vender e quando a quantidade era grande vinham de carro e o Jorge negociava a compra lá fora mesmo, quase sempre fechava a compra só dispensando os semanários de notícias ou as tranqueiras em mal estado. Bem no começo, quando eses livros davam entrada eu já caía em cima para separar o que queria mas ele me chutava logo dali e mandava fazer outra coisa longe. ele me deixava levar uma coisa ou outra, mas nem sempre, às vezes simplesmente dizia não. Eu vivia levando livros para casa mas não conseguia ler tudo que pegava apesar de dar boas duas ou três horas diárias só para ler, e com o tempo fui me dando conta de que estava montando uma micro livraria....